Direito na Saúde Mental
| Introdução
A saúde mental é um tema cada vez mais discutido no mundo atual, uma vez que constitui uma peça central no bem-estar de cada indivíduo e impacta diretamente a sociedade. Ainda assim, a sua promoção é recente e, muitas vezes, não é considerada uma prioridade, pelo que importa combater o estigma e a discriminação que a rodeiam.
Deste modo, o Direito não pode ser indiferente a este tema, pelo que tem de se adaptar, de forma a conseguir dar resposta às necessidades da população e a todas as questões que se colocam à volta desta área da saúde. O artigo 64º da Constituição da República Portuguesa consagra o direito à saúde de todos os cidadãos como um direito fundamental e, ainda, o dever do Estado em concretizar esse direito.
| Saúde Mental
A Organização Mundial da Saúde define saúde mental como: «um estado de bem-estar no qual o indivíduo tem noção das suas capacidades, consegue lidar com as tensões normais da vida, consegue trabalhar de forma produtiva e frutífera e é capaz de contribuir para a comunidade em que se insere».
Passando agora a uma abordagem mais matemática, de acordo com a OMS: cerca de metade da população sofrerá de uma doença mental em algum momento da vida; 2,6% da população sofre de uma perturbação psicótica; 10% sofre de depressão anualmente; A ansiedade é também muito significativa. Na União Europeia, 15% da população já procurou ajuda para um problema psicológico ou emocional e 72% já tomou antidepressivos em algum momento da sua vida.
São vários os fatores que podem pôr em causa a saúde mental, estes podem ser fatores pessoais e sociais, de índole socioeconómica e ligados ao trabalho.
| Saúde Mental em contexto laboral
A saúde e o bem-estar mental podem ser postos em risco de diversas formas, inclusive através de fatores relacionados com o trabalho. Destacam-se os seguintes exemplos: natureza do trabalho; volume e ritmo de trabalho, horários; ambiente; cultura organizacional; relações com os colegas; progressão na carreira; violência e intimidação; assédio.
Tudo isto pode levar a situações de stress, ansiedade, esgotamento, quedas na produtividade, falta de motivação, apatia, entre outros, e consequentemente leva á ausência ao trabalho, á incapacidade e á reforma antecipada, o que causa enormes prejuízos á entidade empregadora.
Ao longo do tempo, estes números têm vindo a aumentar significativamente. Por esse motivo, as boas condições de trabalho são fundamentais para assegurar a saúde mental de um trabalhador, uma vez que este passa uma parte significativa do seu dia a trabalhar.
Como podemos verificar, a saúde mental tem um grande impacto na produtividade do trabalhador e são necessários meios para a proteger. É aqui que surge a importância do direito, este protege o trabalhador e define as condições mínimas de segurança, bem-estar e saúde, no trabalho.
| Burnout
A OMS define o Burnout (ou esgotamento profissional) como uma síndrome resultante do “stress crónico no local de trabalho”. Este pode decorrer de fatores emocionais, físicos e mentais e caracteriza-se pela sensação de esgotamento ou exaustão, ineficácia, falta de realização e pessimismo, em que o indivíduo não encontra prepósito no seu trabalho.
Esta questão tem vindo a tornar-se cada vez mais preocupante, devido ao aumento significativo do número de casos diagnosticados com a síndrome de Burnout. Desta forma, os Estados devem procurar prevenir e proteger os trabalhadores que se encontram nestas situações, sobretudo através da regulação em disposições legais.
| Disposições legais na proteção da Saúde Mental
É fundamental prevenir estes riscos, pelo que a entidade patronal tem a obrigação legal de promover a segurança e a saúde do trabalhador no local de trabalho.
Em Portugal, a tutela da saúde mental no contexto laboral cinge-se à proteção da saúde no geral, imposta pelo Regime Jurídico da Promoção da Segurança e Saúde no Trabalho – Lei n.º 102/2009, de 10 de Setembro, em conjunto com o Código do Trabalho (artigo 127º al. c) “proporcionar boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral”).
Esta obrigação é de tal modo importante que encontra previsão constitucional no artigo 59º nº1 c) da Constituição da República Portuguesa, que consagra o direito “À prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde”.
A Lei n.º 95/2019, de 04 de setembro, institui a Lei de Bases da Saúde. Esta consagra que “O Estado promove a melhoria da saúde mental das pessoas e da sociedade em geral, designadamente através da promoção do bem-estar mental, da prevenção e identificação atempada das doenças mentais e dos riscos a elas associados”.
Outro instrumento legislativo relevante é a Lei n.º 36/98, de 24 de julho, a Lei da Saúde Mental, que densifica a questão do internamento compulsivo.
A nível Europeu, existem várias iniciativas políticas nos domínios da saúde mental e dos riscos psicossociais, como a Diretiva do conselho de 12 de Junho de 1989, relativa à aplicação de medidas que promovem a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no local de trabalho.
| Papel do Estado
Cabe ao Estado a preocupação pelo desenvolvimento de políticas, normas reguladoras ou outros mecanismos legais para proteger o trabalhador enquanto titular de direitos, liberdades e garantias.
A intervenção do legislador nas relações privadas tem como objetivo limitar o poder do empregador, devido à desigualdade da relação jurídica. O não cumprimento das obrigações legais traduz para a entidade empregadora responsabilidades indemnizatórias, administrativas e também penais.
A violação das regras de segurança e saúde do trabalhador leva, nos termos do artigo 18º da Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais, à aplicação do regime geral da responsabilidade civil, sem prejuízo da responsabilidade criminal em que se tenha incorrido.
É á Autoridade para as Condições do Trabalho que compete o controlo do cumprimento da legislação de prevenção das regras de segurança e saúde.